Faris Giacaman* analisa "A Indústria da Paz" do Médio Oriente
Promover
a "coexistência"e"diálogo” é danoso ao apelo da sociedade civil
palestina em favor do boicote e sanções, meios de pressionar o Sionismo
a cessar as violações dos direitos dos palestinos.
Faris Giacaman* |
Somos todos Palestinos |
28-8-2009 | 38 lecturas
www.kaosenlared.net/noticia/faris-giacaman-analisa-industria-da-paz-do-medio-oriente
Ao
descobrirem que sou palestino, muitas pessoas que encontro na
universidade aqui nos Estados Unidos ficam ansiosas por informar-me de
várias atividades em que têm participado a fim de promover
"coexistência" e "diálogo" entre ambos os lados do "conflito", sem
dúvida à espera de um aceno de aprovação da minha parte. Contudo, estes
esforços são danosos e minam o apelo da sociedade civil palestina em
favor do boicote, desinvestimento e sanções a Israel – o único meio de
pressionar Israel a cessar as suas violações dos direitos dos
palestinos.
Quando eu freqüentava o secundário,
em Ramalá, uma das iniciativas "pessoa-a-pessoa" mais conhecidas, a
Seeds of Peace, muitas vezes visitava a minha escola, pedindo aos
estudantes para aderirem ao seu programa. Quase todos os anos eles
enviavam alguns dos meus colegas a um campo de Verão nos EUA com um
grupo de estudantes israelenses. Segundo o sítio web de Seeds of Peace,
ensinam-lhes no campo a "desenvolver empatia, respeito e confiança bem
como liderança, comunicação e aptidões de negociação – componentes
críticos que facilitarão a coexistência pacífica da geração seguinte".
Eles
pintam um quadro róseo e a maior parte das pessoas na universidade fica
muito surpreendida ao ouvir que penso serem tais atividades equivocadas
na melhor das hipóteses e imorais na pior. Por que diabos eu era contra
a "coexistência", perguntavam-me sempre.
Durante
os últimos anos tem havido apelos crescentes a por um fim à opressão do
povo palestino por Israel através de um movimento internacional de
boicote, desinvestimento e sanções (BDS). Uma das objeções comuns ao
boicote é que ele é contra-producente e que o "diálogo" e a "promoção
da coexistência" são muito mais construtivos do que boicotes.
A
partir do início dos acordos de Oslo, em 1993, tem havido toda uma
indústria que opera no sentido de reunir israelenses e palestinos
nestes grupos de "diálogo". A finalidade declarada de tais grupos é a
criação de entendimento entre "ambos os lados conflito", a fim de
"construir pontes" e "ultrapassar barreiras". Contudo, a suposição de
que tais atividades ajudarão a facilitar a paz não é não só incorreta
como realmente carente de moral.
A presunção de
que o diálogo é necessário a fim de alcançar a paz ignora completamente
o contexto histórico da situação na Palestina. Ela assume que ambos os
lados cometeram uma quantidade mais ou menos igual de atrocidades um
contra o outro e que são igualmente culpáveis pelos erros que foram
cometidos. É assumido que nenhum lado está completamente certo ou
completamente errado, mas que ambos têm direitos legítimos que deveriam
ser tratados e certos pontos mortos que devem ser ultrapassados.
Portanto, ambos os lados devem ouvir o ponto de vista do "outro" a fim
de promover o entendimento e a comunicação, os quais presumivelmente
levariam à "coexistência" ou a "reconciliação".
Tal
abordagem é considerada "equilibrada" ou "moderada", como se isto fosse
uma coisa boa. Contudo, a realidade no terreno é imensamente diferente
do que a visão "moderada" deste assim chamado "conflito". Mesmo a
palavra "conflito" é enganosa, pois ela implica uma disputa entre duas
partes simétricas.
A realidade não é assim;
não se trata de um caso de simples falta de entendimento ou de ódio
mútuo que se atravessa no caminho da paz. O contexto da situação em
Israel/Palestina é de colonialismo, apartheid e racismo, uma situação
na qual há um opressor e um oprimido, um colonizador e um colonizado.
Em
casos de colonialismo e apartheid, a história mostra que regimes
coloniais não abandonam o poder sem luta e resistência popular, ou
pressão internacional direta. É uma visão particularmente ingênua
assumir que a persuasão e a "conversação" convencerão um sistema
opressor a renunciar ao seu poder.
O regime do
apartheid na África do Sul, por exemplo, foi finalizado após anos de
luta com a ajuda vital de uma campanha internacional de sanções,
desinvestimentos e boicotes. Se alguém houvesse sugerido aos oprimidos
sul-africanos que viviam nos bantustões a tentar e entender o ponto de
vista do outro (isto é, dos partidários da supremacia branca), as
pessoas sorriam de uma noção tão ridícula. Analogamente, durante a luta
indiana pela emancipação do domínio colonial britânico, Mahatma Gandhi
não teria sido venerado como um combatente pela justiça se houvesse
renunciado à satyagraha – "ater-se firmemente à verdade", a sua
expressão para o movimento de resistência não violenta – e ao invés
disso houvesse advogado em favor do diálogo com os ocupantes
colonialistas britânicos a fim de entender o seu lado da história.
Entretanto,
é verdade que alguns sul-africanos brancos tomaram posição de
solidariedade com os negros oprimidos e participaram na luta contra o
apartheid. E havia, certamente, alguns britânicos dissidentes das
políticas coloniais do seu governo.
Mas
aqueles apoiadores posicionaram-se explicitamente ao lado dos oprimidos
com o objetivo claro de acabar com a opressão, de combater as
injustiças perpetradas pelos seus governos e representantes. Qualquer
reunião conjunta de ambas as partes, portanto, só pode ser moralmente
sã quando os cidadãos do estado opressivo posicionam-se em
solidariedade aos membros do grupo oprimido, não sob a bandeira do
"diálogo" com o objetivo de "entender o outro lado da história".
O diálogo só é aceitável quando efetuado a fim de entender o problema do oprimido, não no contexto de "ouvir ambos os lados".
Entretanto,
tem sido argumentado pelos proponentes palestinos destes grupos de
diálogo que tais atividades podem ser utilizados como uma ferramenta –
não para promover o assim chamado "entendimento" – mas para realmente
ganhar israelenses para luta palestina pela justiça, persuadindo-os ou
"tendo eles de reconhecer a nossa humanidade".
Contudo,
esta concepção também é ingênua. Infelizmente, a maior parte dos
israelenses caiu vítima da propaganda com que o establishment sionista
e os seus muitos instrumentos os alimentam desde tenra idade. Além
disso, exigirá um esforço enorme e concertado contrariar esta
propaganda através da persuasão. A maior dos israelenses, por exemplo,
não será convencida de que o seu governo atingiu um nível de
criminalidade que justifique um apelo ao boicote. Mesmo que eles sejam
convencidos logicamente das brutalidades da opressão israelense,
provavelmente não será o suficiente para levá-los a qualquer forma de
ação. Isto se tem provado reiteradamente verdadeiro, o que é evidente
no fracasso abjeto de tais grupos de diálogo para formarem qualquer
movimento abrangente anti-ocupação desde os seus primórdios com o
processo de Oslo. Na realidade, nada menos do que a pressão sustentada
– não a persuasão – fará os israelenses perceberem que os direitos dos
palestinos têm de ser retificados. Esta é a lógica do movimento BDS, o
qual é inteiramente oposto à falsa lógica do diálogo.
Com
base num relatório não publicado de 2002 do Israel/Palestine Center for
Research and Information, o San Francisco Chronicle informou em Outubro
último que "entre 1993 e 2000 [apenas], governos e fundações ocidentais
gastaram entre US$20 milhões e US$25 milhões nos grupos de diálogo". Um
ulterior inquérito em grande escala a palestinos que participaram nos
grupos de diálogo revelou que esta grande despesa falhou em produziu
"um único ativista da paz em qualquer dos lados". Isto confirma a
crença entre palestinos de que todo o empreendimento é um desperdício
de tempo e de dinheiro.
O inquérito também
revelou que os participantes palestinos não eram plenamente
representativos da sua sociedade. Muitos participantes tendiam a ser
"filhos ou amigos de altos responsáveis palestinos ou das elites
econômicas. Apenas sete por cento dos participantes eram residentes em
campos de refugiados, muito embora eles constituam 16 por cento da
população palestina". O inquérito também descobriu que 91 por cento dos
participantes palestinos já não mantinham laços com os israelenses com
quem se encontraram. Além disso, 93 por cento não foram abordados com
atividade de campo a seguir e apenas cinco por cento concordaram em que
toda a experiência ajudou a "promover paz, cultura e diálogo entre
participantes".
Apesar do inequívoco fracasso
destes projetos de diálogo, continua a ser investido dinheiro neles.
Como explicou Omar Barghouti, um dos membros fundados do movimento BDS
na Palestina, em The Electronic Intifada, "houve demasiadas tentativas
de diálogo desde 1993 ... tornou-se uma indústria – chamamo-la a
indústria da paz".
Isto pode ser atribuído
parcialmente a dois fatores. O fator dominante é o papel utilizável de
tais projetos em relações públicas. O Seeds of Peace, por exemplo,
jacta-se da sua legitimidade apresentando um impressionante conjunto de
endossos por parte de políticos e autoridades tais como Hillary
Clinton, Bill Clinton, George Mitchell, Shimon Peres, George Bush,
Colin Powell e Tony Blair, dentre outros. O segundo fator é a
necessidade de certos "esquerdistas" e "liberais" israelenses sentirem
como se estivessem a fazer alguma coisa admirável ao "questionarem-se",
quando na realidade eles não tomam nenhum posicionamento significativo
contra os crimes que o seu governo comete em seu nome. Os políticos e
os governos ocidentais continuam a financiar tais projetos, promovendo
dessa forma as suas imagens como apoiantes da "coexistência", e os
"liberais" participantes israelenses podem isentar-se de qualquer culpa
pela participação no nobre ato de "promover a paz". Um relacionamento
simbiótico, muito insatisfatório.
A falta de
resultados de tais iniciativas não é surpreendente, pois os objetivos
declarados do diálogo e grupos de "coexistência" não incluem convencer
israelenses a ajudar palestinos a ganharem o respeito dos seus direitos
inalienáveis. A exigência mínima de reconhecer a natureza inerentemente
opressiva de Israel está ausente nestes grupos de diálogo. Ao invés
disso, estas organizações operam sob a dúbia suposição de que o
"conflito" é muito complexo e multifacetado, onde há "dois lados em
toda história" e que cada narrativa tem certas afirmações válidas assim
como dúbias.
Quando o apelo autorizado Campanha
Palestina pelo Boicote Académico e Cultural de Israel faz o seu
caminho, quaisquer atividades conjuntas palestino-israelenses – quer
sejam projeções de filmes ou campos de Verão – pode ser aceitável só
quando o seu objetivo declarado for finalizar, protestar e/ou despertar
a consciência quanto à opressão dos palestinos.
Qualquer
israelense que procure interagir com palestinos, com o objetivo claro
de solidariedade e de ajudá-los a acabar com a opressão, será saudado
de braços abertos. Mas deve haver cautela, contudo, quando são feitos
convites para participar num diálogo entre "ambos os lados" do assim
chamado "conflito".
Qualquer apelo a um
discurso "equilibrado" sobre esta questão – onde o lema "há dois lados
em toda história" é reverenciado quase religiosamente – É
intelectualmente e moralmente desonesto pois ignora o fato de que,
quando se trata de casos de colonialismo, apartheid e opressão não tal
coisa como "equilíbrio". A sociedade opressora, de modo geral, não renunciará aos seus privilégios sem pressão.
É por isso que a campanha BDS é um importante instrumento de mudança.
[*] Estudante palestino da Cisjordânia, a fazer o segundo ano da universidade nos Estados Unidos
O original encontra-se em http://electronicintifada.net/v2/article10722.shtml
Promover
a "coexistência"e"diálogo” é danoso ao apelo da sociedade civil
palestina em favor do boicote e sanções, meios de pressionar o Sionismo
a cessar as violações dos direitos dos palestinos.
Faris Giacaman* |
Somos todos Palestinos |
28-8-2009 | 38 lecturas
www.kaosenlared.net/noticia/faris-giacaman-analisa-industria-da-paz-do-medio-oriente
Ao
descobrirem que sou palestino, muitas pessoas que encontro na
universidade aqui nos Estados Unidos ficam ansiosas por informar-me de
várias atividades em que têm participado a fim de promover
"coexistência" e "diálogo" entre ambos os lados do "conflito", sem
dúvida à espera de um aceno de aprovação da minha parte. Contudo, estes
esforços são danosos e minam o apelo da sociedade civil palestina em
favor do boicote, desinvestimento e sanções a Israel – o único meio de
pressionar Israel a cessar as suas violações dos direitos dos
palestinos.
Quando eu freqüentava o secundário,
em Ramalá, uma das iniciativas "pessoa-a-pessoa" mais conhecidas, a
Seeds of Peace, muitas vezes visitava a minha escola, pedindo aos
estudantes para aderirem ao seu programa. Quase todos os anos eles
enviavam alguns dos meus colegas a um campo de Verão nos EUA com um
grupo de estudantes israelenses. Segundo o sítio web de Seeds of Peace,
ensinam-lhes no campo a "desenvolver empatia, respeito e confiança bem
como liderança, comunicação e aptidões de negociação – componentes
críticos que facilitarão a coexistência pacífica da geração seguinte".
Eles
pintam um quadro róseo e a maior parte das pessoas na universidade fica
muito surpreendida ao ouvir que penso serem tais atividades equivocadas
na melhor das hipóteses e imorais na pior. Por que diabos eu era contra
a "coexistência", perguntavam-me sempre.
Durante
os últimos anos tem havido apelos crescentes a por um fim à opressão do
povo palestino por Israel através de um movimento internacional de
boicote, desinvestimento e sanções (BDS). Uma das objeções comuns ao
boicote é que ele é contra-producente e que o "diálogo" e a "promoção
da coexistência" são muito mais construtivos do que boicotes.
A
partir do início dos acordos de Oslo, em 1993, tem havido toda uma
indústria que opera no sentido de reunir israelenses e palestinos
nestes grupos de "diálogo". A finalidade declarada de tais grupos é a
criação de entendimento entre "ambos os lados conflito", a fim de
"construir pontes" e "ultrapassar barreiras". Contudo, a suposição de
que tais atividades ajudarão a facilitar a paz não é não só incorreta
como realmente carente de moral.
A presunção de
que o diálogo é necessário a fim de alcançar a paz ignora completamente
o contexto histórico da situação na Palestina. Ela assume que ambos os
lados cometeram uma quantidade mais ou menos igual de atrocidades um
contra o outro e que são igualmente culpáveis pelos erros que foram
cometidos. É assumido que nenhum lado está completamente certo ou
completamente errado, mas que ambos têm direitos legítimos que deveriam
ser tratados e certos pontos mortos que devem ser ultrapassados.
Portanto, ambos os lados devem ouvir o ponto de vista do "outro" a fim
de promover o entendimento e a comunicação, os quais presumivelmente
levariam à "coexistência" ou a "reconciliação".
Tal
abordagem é considerada "equilibrada" ou "moderada", como se isto fosse
uma coisa boa. Contudo, a realidade no terreno é imensamente diferente
do que a visão "moderada" deste assim chamado "conflito". Mesmo a
palavra "conflito" é enganosa, pois ela implica uma disputa entre duas
partes simétricas.
A realidade não é assim;
não se trata de um caso de simples falta de entendimento ou de ódio
mútuo que se atravessa no caminho da paz. O contexto da situação em
Israel/Palestina é de colonialismo, apartheid e racismo, uma situação
na qual há um opressor e um oprimido, um colonizador e um colonizado.
Em
casos de colonialismo e apartheid, a história mostra que regimes
coloniais não abandonam o poder sem luta e resistência popular, ou
pressão internacional direta. É uma visão particularmente ingênua
assumir que a persuasão e a "conversação" convencerão um sistema
opressor a renunciar ao seu poder.
O regime do
apartheid na África do Sul, por exemplo, foi finalizado após anos de
luta com a ajuda vital de uma campanha internacional de sanções,
desinvestimentos e boicotes. Se alguém houvesse sugerido aos oprimidos
sul-africanos que viviam nos bantustões a tentar e entender o ponto de
vista do outro (isto é, dos partidários da supremacia branca), as
pessoas sorriam de uma noção tão ridícula. Analogamente, durante a luta
indiana pela emancipação do domínio colonial britânico, Mahatma Gandhi
não teria sido venerado como um combatente pela justiça se houvesse
renunciado à satyagraha – "ater-se firmemente à verdade", a sua
expressão para o movimento de resistência não violenta – e ao invés
disso houvesse advogado em favor do diálogo com os ocupantes
colonialistas britânicos a fim de entender o seu lado da história.
Entretanto,
é verdade que alguns sul-africanos brancos tomaram posição de
solidariedade com os negros oprimidos e participaram na luta contra o
apartheid. E havia, certamente, alguns britânicos dissidentes das
políticas coloniais do seu governo.
Mas
aqueles apoiadores posicionaram-se explicitamente ao lado dos oprimidos
com o objetivo claro de acabar com a opressão, de combater as
injustiças perpetradas pelos seus governos e representantes. Qualquer
reunião conjunta de ambas as partes, portanto, só pode ser moralmente
sã quando os cidadãos do estado opressivo posicionam-se em
solidariedade aos membros do grupo oprimido, não sob a bandeira do
"diálogo" com o objetivo de "entender o outro lado da história".
O diálogo só é aceitável quando efetuado a fim de entender o problema do oprimido, não no contexto de "ouvir ambos os lados".
Entretanto,
tem sido argumentado pelos proponentes palestinos destes grupos de
diálogo que tais atividades podem ser utilizados como uma ferramenta –
não para promover o assim chamado "entendimento" – mas para realmente
ganhar israelenses para luta palestina pela justiça, persuadindo-os ou
"tendo eles de reconhecer a nossa humanidade".
Contudo,
esta concepção também é ingênua. Infelizmente, a maior parte dos
israelenses caiu vítima da propaganda com que o establishment sionista
e os seus muitos instrumentos os alimentam desde tenra idade. Além
disso, exigirá um esforço enorme e concertado contrariar esta
propaganda através da persuasão. A maior dos israelenses, por exemplo,
não será convencida de que o seu governo atingiu um nível de
criminalidade que justifique um apelo ao boicote. Mesmo que eles sejam
convencidos logicamente das brutalidades da opressão israelense,
provavelmente não será o suficiente para levá-los a qualquer forma de
ação. Isto se tem provado reiteradamente verdadeiro, o que é evidente
no fracasso abjeto de tais grupos de diálogo para formarem qualquer
movimento abrangente anti-ocupação desde os seus primórdios com o
processo de Oslo. Na realidade, nada menos do que a pressão sustentada
– não a persuasão – fará os israelenses perceberem que os direitos dos
palestinos têm de ser retificados. Esta é a lógica do movimento BDS, o
qual é inteiramente oposto à falsa lógica do diálogo.
Com
base num relatório não publicado de 2002 do Israel/Palestine Center for
Research and Information, o San Francisco Chronicle informou em Outubro
último que "entre 1993 e 2000 [apenas], governos e fundações ocidentais
gastaram entre US$20 milhões e US$25 milhões nos grupos de diálogo". Um
ulterior inquérito em grande escala a palestinos que participaram nos
grupos de diálogo revelou que esta grande despesa falhou em produziu
"um único ativista da paz em qualquer dos lados". Isto confirma a
crença entre palestinos de que todo o empreendimento é um desperdício
de tempo e de dinheiro.
O inquérito também
revelou que os participantes palestinos não eram plenamente
representativos da sua sociedade. Muitos participantes tendiam a ser
"filhos ou amigos de altos responsáveis palestinos ou das elites
econômicas. Apenas sete por cento dos participantes eram residentes em
campos de refugiados, muito embora eles constituam 16 por cento da
população palestina". O inquérito também descobriu que 91 por cento dos
participantes palestinos já não mantinham laços com os israelenses com
quem se encontraram. Além disso, 93 por cento não foram abordados com
atividade de campo a seguir e apenas cinco por cento concordaram em que
toda a experiência ajudou a "promover paz, cultura e diálogo entre
participantes".
Apesar do inequívoco fracasso
destes projetos de diálogo, continua a ser investido dinheiro neles.
Como explicou Omar Barghouti, um dos membros fundados do movimento BDS
na Palestina, em The Electronic Intifada, "houve demasiadas tentativas
de diálogo desde 1993 ... tornou-se uma indústria – chamamo-la a
indústria da paz".
Isto pode ser atribuído
parcialmente a dois fatores. O fator dominante é o papel utilizável de
tais projetos em relações públicas. O Seeds of Peace, por exemplo,
jacta-se da sua legitimidade apresentando um impressionante conjunto de
endossos por parte de políticos e autoridades tais como Hillary
Clinton, Bill Clinton, George Mitchell, Shimon Peres, George Bush,
Colin Powell e Tony Blair, dentre outros. O segundo fator é a
necessidade de certos "esquerdistas" e "liberais" israelenses sentirem
como se estivessem a fazer alguma coisa admirável ao "questionarem-se",
quando na realidade eles não tomam nenhum posicionamento significativo
contra os crimes que o seu governo comete em seu nome. Os políticos e
os governos ocidentais continuam a financiar tais projetos, promovendo
dessa forma as suas imagens como apoiantes da "coexistência", e os
"liberais" participantes israelenses podem isentar-se de qualquer culpa
pela participação no nobre ato de "promover a paz". Um relacionamento
simbiótico, muito insatisfatório.
A falta de
resultados de tais iniciativas não é surpreendente, pois os objetivos
declarados do diálogo e grupos de "coexistência" não incluem convencer
israelenses a ajudar palestinos a ganharem o respeito dos seus direitos
inalienáveis. A exigência mínima de reconhecer a natureza inerentemente
opressiva de Israel está ausente nestes grupos de diálogo. Ao invés
disso, estas organizações operam sob a dúbia suposição de que o
"conflito" é muito complexo e multifacetado, onde há "dois lados em
toda história" e que cada narrativa tem certas afirmações válidas assim
como dúbias.
Quando o apelo autorizado Campanha
Palestina pelo Boicote Académico e Cultural de Israel faz o seu
caminho, quaisquer atividades conjuntas palestino-israelenses – quer
sejam projeções de filmes ou campos de Verão – pode ser aceitável só
quando o seu objetivo declarado for finalizar, protestar e/ou despertar
a consciência quanto à opressão dos palestinos.
Qualquer
israelense que procure interagir com palestinos, com o objetivo claro
de solidariedade e de ajudá-los a acabar com a opressão, será saudado
de braços abertos. Mas deve haver cautela, contudo, quando são feitos
convites para participar num diálogo entre "ambos os lados" do assim
chamado "conflito".
Qualquer apelo a um
discurso "equilibrado" sobre esta questão – onde o lema "há dois lados
em toda história" é reverenciado quase religiosamente – É
intelectualmente e moralmente desonesto pois ignora o fato de que,
quando se trata de casos de colonialismo, apartheid e opressão não tal
coisa como "equilíbrio". A sociedade opressora, de modo geral, não renunciará aos seus privilégios sem pressão.
É por isso que a campanha BDS é um importante instrumento de mudança.
[*] Estudante palestino da Cisjordânia, a fazer o segundo ano da universidade nos Estados Unidos
O original encontra-se em http://electronicintifada.net/v2/article10722.shtml
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